O WHATSAPP COMO FERRAMENTA DE COMBATE À FAKE SCIENCE

Autores

  • Eduardo Bruno Almeida dos Santos Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas
  • Luis Paulo Leopoldo Mercado Universidade Federal de Alagoas
  • Rossana Viana Gaia Instituto Federal de Alagoas

Palavras-chave:

Saúde, fake news, Whatsapp, fact-checking.

Resumo

Introdução: Este artigo resulta de pesquisa aplicada sobre o uso do Whatsapp pelo Ministério da Saúde (doravante MS) como ferramenta de combate às fake news sobre saúde (a partir de agora fake science), na campanha “Saúde sem fake news”. A investigação visou responder a seguinte questão: o aplicativo é eficaz no enfrentamento das notícias falsas? O percurso metodológico da pesquisa iniciou com análise descritiva do canal criado pelo Governo Federal no Whatsapp e divulgado no site oficial do MS. Houve levantamento quantitativo das informações enviadas para checagem, sendo aporte teórico artigos na base SciELO e livros que avaliam o emprego de falsos argumentos em mídias móveis e teoria de checagem de fatos. A mensuração dos resultados e contagem das informações na página indica maior valência para notícias falsas, o que indica um serviço fact-checking do MS com potencial de abrangência. A relevância deste estudo decorre do universo de pessoas que precisa de informações verdadeiras sobre saúde pública, pois fake science pode levar à morte. Com cerca de 1 bilhão de usuários, distribuídos em mais de 180 países, o Whatsapp configura importante ferramenta de comunicação global. Através do aplicativo, são enviadas mensagens a várias pessoas em listas ou grupos. Aliadas ao crescimento de dispositivos móveis, essas comunicações superam redes sociais como fontes de informação (CANAVILHAS; RODRIGUES, 2017). A “Era da Pós-Verdade”, incorporada ao Oxford Dictionaries em 2016 (GENESINI, 2018) se refere às circunstâncias em que fatos objetivos são menos influentes para opinião pública do que os apelos à emoção e à crença pessoal (SANTAELLA, 2018). O uso do termo cresceu após o referendo britânico sobre permanência na União Europeia, em 2016, e dos fenômenos eleitorais estadunidense e brasileiro, em 2016 e 2018, respectivamente (D’ANCONA, 2018). Neste cenário, é possível minimizar o compartilhamento em massa de fake science? O percurso metodológico da pesquisa incluiu análise descritiva do canal criado pelo MS. O levantamento quantitativo das informações enviadas para checar e mensurar os resultados fundamenta a análise. Descrição da Experiência O canal “Saúde sem fake news” foi criado pelo MS para receber e enviar mensagens, pelo WhatsApp e combater notícias falsas na saúde, através do telefone (61) 99289-4640. Para compreender a estratégia, analisamos descritivamente o canal e os critérios para checar dados. Segundo o MS, dados duvidosos são recebidos por uma equipe multimídia e enviados a especialistas da área técnica, responsáveis pela análise, apuração e elaboração de resposta para a equipe multimídia aplicar o selo “isto é notícia falsa” ou “isto é notícia verdadeira”. Os resultados são publicados no Portal Saúde (a partir de agora PS), nos perfis oficiais do MS e repassados ao solicitante. No PS (http://portalms.saude.gov.br/fakenews) consta lista atualizada de informações analisadas pela equipe de especialistas, onde se pode buscar pelo título da informação ou a partir de filtros como período de publicação. O regulamento e os termos de uso do serviço exigem dados do solicitante e funciona de 2ª a 6ª feira, das 10h30 às 12h e das 14h às 18h. A análise considerou número estatístico de mensagens recebidas pela equipe do MS e o quantitativo de notícias disponíveis no PS entre agosto – lançamento do serviço – e novembro de 2018. Foram analisados e categorizados os conteúdos publicados, o que definiu ranking de assuntos mais disseminados via fake science por Whatsapp. Resultados e Discussões Os dados indicam que, no período analisado, o “Saúde sem fake news” recebeu 1.597 mensagens, das quais 310 eram falsas. As informações compartilhadas tinham erros, links para sites com notícias enganosas e áudios ou vídeos com pessoas que fingiam ser profissionais da saúde. O MS divulgou 28 notícias no PS, neste período, nas quais esclarece conteúdos recebidos, sendo 25 notícias falsas e apenas três verdadeiras. A primeira publicação, no dia 24 de agosto, divulgou duas matérias sobre vacinação, sendo uma verdadeira e outra falsa. A segunda etapa de publicações foi no dia 28, com duas sobre vacinação e uma sobre o programa Jovem SUS. No dia 29, há seis matérias, sobre próstata, HIV e produção de medicamentos, sendo apenas duas publicações verdadeiras. Por fim, no dia 30, há duas notícias sobre vacinação e fardamento de profissionais. Em setembro, são sete publicações. A primeira no dia 3, com uma notícia sobre vacinação. No dia 5, há dois textos sobre diabetes e um sobre possível surto da peste negra. No dia 6, houve uma publicação sobre câncer de olho. Em 21 de setembro, há registro sobre riscos para tingir cabelo. Nos dias 25 e 27, há informações sobre produção e consumo de medicamentos e exames médicos. Em outubro, houve redução de publicações no PS. Foram veiculadas três matérias jornalísticas, com base em mentiras, com seguintes temáticas: dia 3, tratamento alternativo contra o câncer; dia 4, medicamentos; e dia 17, contratação de profissionais sem experiência. Em novembro, há cinco publicações, todas com rótulo de mentirosas, até o dia 26. A primeira delas no dia 8, aborda tratamento alternativo contra câncer e há repetição temática nos dias 21, 22 e 26. No dia 9, foi publicada notícias sobre fake science que associa cegueira a besouros. A análise indica liderança de fake science sobre “vacinação” via Whatsapp, com seis publicações no portal. Em seguida, empatam com cinco publicações cada, os temas “utilização de medicamentos/produção de medicamentos” e “tratamento alternativo contra o câncer”. Foram categorizados os temas vacinação (6 publicações), medicamentos e tratamentos alternativos para o câncer (5 publicações) e assuntos diversos (1 publicação). As temáticas abordadas são: jovem, SUS, próstata, HIV, fardamento de profissionais, câncer, bactérias, diabetes, peste negra, tingimento de cabelo, realização de exames, contratação de profissionais e cegueira. O trabalho do “Saúde sem fake news” se assemelha à apuração jornalística fact-checking. Conforme Souza (2017), as primeiras empresas em apuração de notícias foram estadunidenses, nos anos 1990. No Brasil, Santos; Spinelli (2017) indicam três agências que checam fatos: Lupa (incubada à Revista Piauí), Pública e Aos Fatos. Nos últimos anos, veículos de comunicação tradicionais passaram a divulgar dados incorretos ou imprecisos que circulam em mídias. O processo desenvolvido pelo MS embora similar ao das agências, diferencia-se das empresas privadas que buscam dados ou declarações públicas, pois a equipe do MS recebe demandas espontâneas e representa especialistas com autoridade para esclarecer se o conteúdo é verdadeiro ou falso. Conclusões As Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação (TDIC) alteraram o modo de produzir e distribuir conteúdo. Os consumidores da informação passaram a atuar como (re)produtores de notícias, com poder de disseminar conteúdos para grande número de pessoas e aplicativos de mensagens se destacam como principais repassadores informação. Atento a esse movimento, o MS criou o canal de comunicação “Saúde sem fake news”, com primeiro post em agosto de 2018, sobre mensagem recebida pelo WhatsApp, para enfrentar fake science. As informações são apuradas e publicadas com indicação de verdadeiro ou falso. A análise das estatísticas do MS revela grande demanda e só no primeiro mês do serviço, chegaram 1.597 mensagens com a classificação de 310 publicações falsas. Houve também a publicação de 28 textos jornalísticos com esclarecimentos a partir de publicações recebidas – sendo três verdadeiras e 25 falsas. Os dados indicam que o canal “Saúde sem fake news” funciona como plataforma de checagem de fatos similar às jornalísticas. Neste caso, a diferença a favor da iniciativa governamental é a recepção de demandas espontâneas, pois as agências de checagem selecionam informações investigadas. Com base na análise, categorizamos a iniciativa do MS como serviço educativo, pois esclarece fatos inventados e adverte usuários do Whatsapp sobre riscos do compartilhar fake science. Concluímos que o aplicativo de mensagens funciona como relevante ferramenta para enfrentar a proliferação da fake science, mas ressaltamos a importância de continuidade e da análise dos dados para maior espaço de tempo até precisar sua efetiva aplicabilidade. Reconhecemos, que esta pesquisa não se encerra neste artigo e que pode desencadear novos estudos sobre o assunto.

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Biografia do Autor

Eduardo Bruno Almeida dos Santos, Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas

Mestrando em Educação pela Universidade Federal de Alagoas; especialista em Assessoria de Comunicação e Marketing pelo Centro Universitário Cesmac; graduado em Comunicação Social/Jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas. Eduardo Almeida é jornalista efetivo da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas, com experiências nas áreas de assessoria de comunicação, jornalismo impresso e webjornalismo.

Luis Paulo Leopoldo Mercado, Universidade Federal de Alagoas

Professor Titular da Universidade Federal de Alagoas; doutor. em Educação (PUC-SP); bolsista Produtividade em Pesquisa 2/CNPq.

Rossana Viana Gaia, Instituto Federal de Alagoas

Professora Titular do Instituto Federal de Alagoas (IFAL/ProfEPT); doutora em Linguística (UFAL); desenvolve estudo pós-doutoral no PPGCIn/UFPE sob supervisão do Prof. Dr. Alex Sandro Gomes.

Referências

Referências

CANAVILHAS, J. RODRIGUES, C. Jornalismo móvel: linguagem, gênero e modalidade de negócios. Sevilhã: Universidade de Beira e Interior, 2017. Disponível em: < http://www.labcom-ifp.ubi.pt/ficheiros/201703301136-201704_jdm.pdf>. Acesso em: 7. out. 2019.

D’ANCONA, Matthew. Pós-Verdade: a nova guerra contra os fatos em tempos de fake news. 1ª edição. Barueri: Faro Editorial, 2018.

ESTADÃO CONTEÚDO. Ministério da Saúde identifica 185 focos de fake news e reforça campanhas. Disponível em: https://www.istoedinheiro.com.br/ministerio-da-saude-identifica-185-focos-de-fake-news-e-reforca-campanhas/. Acesso em: 24 nov. 2018.

GENESINI, S. A pós-verdade é uma notícia falsa. Dossiê Pós-Verdade e Jornalismo. Revista USP, nº 116, p. 45-58, São Paulo: ECA/USP, jan.-mar 2018. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/revusp/article/download/146577/140223/>. Acesso em: 7. Out.2019.

MINISTÉRIO DA SAÚDE. Saúde sem fake news. Disponível em: http://portalms.saude.gov.br/fakenews. Acesso em: 10 nov. 2018.

SANTAELLA, Lucia. A Pós-Verdade é verdadeira ou falsa? Barueri: Estação das Letras e Cores, 2018.

SANTOS, J.; SPINELLI, E. M. Pós-verdade, Fake News e fact-chacking: impactos e oportunidades para o jornalismo. Anais do 15º SBPJOR. São Paulo: SBPJOR; ECA/USP, 2017. Disponível em: <http://sbpjor.org.br/congresso/index.php/sbpjor/sbpjor2017/paper/viewFile/746/462 >. Acesso em: 7. out.2019.

SOUZA, Rogério M. de. Investigando as fake news: análise das as agências fiscalizadoras de notícias falsas no Brasil. 2017. Disponível em: <http://portalintercom.org.br/anais/sudeste2017/resumos/R58-0343-1.pdf>. Acesso em: 25 nov. 2018.

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Publicado

2020-04-13

Como Citar

Santos, E. B. A. dos, Mercado, L. P. L., & Gaia, R. V. (2020). O WHATSAPP COMO FERRAMENTA DE COMBATE À FAKE SCIENCE. II Encontro Regional Norte-Nordeste Da ABCiber, (1). Recuperado de https://eventosgrupotiradentes.emnuvens.com.br/abciber/article/view/12246

Edição

Seção

Redes sociotécnicas e Difusão Científica